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Tudo começou com um sonho, ou uma visão, de uma mesa bem grande, cheia de doces, e a imagem de Nossa Senhora “muito linda, muito brilhante”. Vanilda da Silva Domingos tinha 18 anos e morava próximo à Igreja Católica, no centro de Bela Vista do Paraíso. Acordou assustada, chorando, foi até a mãe e afirmou: nós vamos fazer uma festa para Nossa Senhora. Dona Elvira não entendeu direito. “Como vamos fazer? Não preparamos nada”. Vanilda deu um jeito: assaram um bolo, confeitaram, e pegaram doces do bar do pai dela.
A mãe ainda questionou. Como fazer uma festa sem ter convidados? Mas isso também não foi problema. A mesa já estava preparada quando as crianças começaram a sair da missa, que também lhes homenageava pelo seu dia. “Eu comecei a chamar as crianças e aí encheu, lotou. Nós rezamos o terço e cortamos o bolo”, conta.
De lá até aqui, a festa se repetiu em todos os anos e virou tradição. Nesta sexta-feira (12), dezenas de adultos e crianças se reuniram no número 182 da avenida Indianópolis, em Santa Margarida para participar da comemoração. Como de costume, começou com a reza do terço à padroeira do Brasil, em homenagem e agradecimento pelas graças alcançadas. A própria dona Elvira Quasne da Silva fez questão de guiar o terço. Na sequência, foram distribuídos os lanches e repartido o enorme bolo, preparado durante a semana por familiares e voluntários. Além deste, outros foram feitos para serem doados.
Também foi assim nos anos anteriores. “Teve ano em que chegamos a fazer 13 bolos. Doamos para a Fazenda Paraíso, Fazenda Cascata, Fazenda Horizonte, onde tinha bastante gente na época, depois teve o assentamento [Iraci Salete], [conjunto] Rosa Luppi, a gente doava na igreja, no lar, na creche…”, lembra Vanilda.
Ela também se recorda de um ano em que ainda faltavam dois bolos para serem doados. Saíram ela e o irmão, o Sabiá, a procura de alguém para receber a doação. Avistaram um grupo de pessoas em uma casa. “Veio a dona Oscarina chorando e disse: Vanilda, você sabe qual a primeira casa onde esta imagem [de Nossa Senhora] chegou aqui em Santa Margarida? Na tua casa. Eu parei lá e você guardou ela para mim”, lembra. Após rezar o terço, ela conta que saiu de lá chorando. Nos conjuntos habitacionais do distrito, encontraram outro grupo de crianças. A moradora, conhecida como Dona Nega, também se emocionou e insistiu que Vanilda participasse da reza. “Até hoje, na dona Oscarina, na dona Nega e no asilo, são lugares em que eu não falho”, contou Vanilda.
A colaboração com tudo isso surge de maneira espontânea. Mesmo nos anos em que Vanilda achava que não teria como realizar a festa, as doações foram chegando, de conhecidos e comerciantes locais. “Um vem e traz refrigerante, outro traz um pacote de açúcar, nesse ano um rapaz doou uma caixa de ovo, que até sobrou”, relatou Vanilda. A mãe, dona Elvira, mesmo com seus 83 anos, ajudou a preparar os bolos.
Em algumas ocasiões, surgiram dificuldades. “Na quarta-feira a gente estava assando os bolos e veio a notícia de que minha tia, de 90 anos, que vem para participar todas as vezes, havia falecido”, contou. Mas com todas as doações recebidas e a organização sendo feita, não havia como cancelar o evento: “Eu sei que, onde a minha tia está, ela está feliz de eu ter feito a festa para as crianças”.
A tradição que começou na adolescência já dura mais de 40 anos. Hoje com duas filhas e dois netos, Vanilda pretende continuar realizando a homenagem à padroeira. “É uma coisa muito bonita e eu acho que enquanto eu for viva… Eu não sei, não fiz promessa de continuar até morrer, mas foi muito bom fazer”, concluiu.
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